quarta-feira, 28 de agosto de 2013

CIDADE EM FESTA



Viva Mogi das Cruzes! Ainda que gregos e troianos discordem quanto a idade e o fundador desta urbe, pelo menos o feriado local está correto: data de 1 de setembro de 1611 o Foral que lhe concedeu o estatuto de vila, desprendendo-a da São Paulo antiga. Mogi tem formalmente, 402 anos a serem comemorados, dependendo do ponto de vista com que a velha senhora é encarada. Uma passadinha no Arquivo Municipal prova o que digo, há lá uma cópia do Foral em perfeitas condições por quem ainda é alfabetizado nesta cidade e não precisa de filmes dublados para se divertir no cinema...

 No primeiro dia que vim conhecer Mogi, há 40 anos, vi que se tratava de uma cidade bem provinciana, feia, sem manutenção nos edifícios antigos que pareciam gritar: "derrubem-nos! ponham-nos abaixo! acabem conosco!será que não percebem que podemos ser substituídos por grandes massas de concreto?". Pois era isso. Muito menos gente, muitos estudantes,  e um povo trabalhador sem se preocupar que o sítio estava prenhe. Embora a cidade fosse mameluca de origem, já fora colorida de europeus e orientais.Esses últimos davam graça ao lugar. Que bonito era ver o entorno hortifrutigranjeiro de Mogi!

Resolvemos morar aqui, mas era hora do almoço e tínhamos fome. Como o nosso conhecimento local era pouco, paramos para lanchar numa lanchonete próxima à estação de trem. Lá havia hamburguer ao molho moscatel, ou seja, carne  passada na chapa e catchup atolado de moscas mortas.Ai, que nojo! Mesmo assim mudamos para cá, e conosco Mogi foi mudando também. Não posso vos dizer que o padrão de cultura do povo avançou na mesma medida que as vias asfaltadas, os prédios novos edificados em lugares onde antes havia monumentos preciosos do barroco, mas, a cidade foi aumentando demograficamente e isso obrigou as autoridades a pensar em saídas para oferecer escolas e outras pinceladas de benefícios ao povo. Mudaram também os coronéis. Edifícios verticalizaram as moradias, invadindo brejos e cortando matas.Vieram os condomínios, o Shopping, as Academias de Ginástica...

Hoje Mogi está enorme, mas é uma cidade silenciosa. Arthur Moreira Lima não tocou aqui, pois não havia platéia. Este silêncio é algo rural, mesmo com tantos automóveis. Não sabemos ainda o que fazer com o lixo, mas é possível, pelo menos, ver os colibris se empanturrarem do mel das flores de grevíleas. E ler um bom livro ainda que falte uma livraria decente. Não há um Centro Cultural para encontrar amigos, nem recinto de exposições, nem amparo para artistas, nem uma biblioteca que atenda pessoas buscando cultura mais elaborada. Enfim, a cidade perdeu sua bonomia interiorana, mas falta muito para chegar a ser metropolitana. Bom Futuro, minha cidade. Erga os espíritos com a mesma pressa que crescem as moradias.

Complexo histórico do Carmo

Coreto do Largo do Bom Jesus

sexta-feira, 9 de agosto de 2013

PAIS



Pode alguém imaginar que um garoto de 13 anos mate toda a família e se suicide em seguida?Nos dias atuais tudo é possível, mas eu creio que a polícia possa encontrar dados que levem a uma conclusão mais precisa. Não vale precipitar conclusões. No entanto, sabemos muito bem quantos garotos aos 13 anos estão potencialmente prontos a roubar, matar, extorquir, supliciar, enfim, praticar males terríveis contra o próximo. Basta um desvio de conduta, uma idéia e uma súbita ebulição dos hormônios ou dos nervos e, pronto, um garoto pode tudo.

Mas,nem tudo está perdido. Antes, quero lembrar que, neste domingo, comemoramos o dia dos Pais, e só quem teve um pai presente e amoroso como eu, pode dizer que, nas profundas mudanças pelas quais passa a família, um pai pode muito bem significar o equilíbrio do lar. Nem a TV, nem os jogos eletrônicos conseguem superar uma única palavra de amor de um pai. Por outro lado, o pai é o exemplo em que se espelham os filhos: É neles que as meninas conceituam a figura masculina; é no comportamento deles que os garotos aprendem a ser homens, gente grande de fato.

Há muitos pais que não assumem seus filhos. Assim também há um vasto número de crianças que jamais saberão quem lhes deu a célula germinal, e suas mães cumprem duplo papel, auxiliadas por parentes ou amigos. Li um dia uma pesquisa que chegava à conclusão que eram mais estáveis psicologicamente os órfãos ou filhos de pais desconhecidos, do que jovens oriundos de lares emocionalmente desgastantes, com brigas do casal, intromissão de parentes inconvenientes. Pode até ser que o grupo pesquisado tenha oferecido estes resultados, mas com certeza não levou em conta outros elementos que fazem parte da vida da criança, e que se encontram à disposição dela desde que ela põe o pé na rua e registra atitudes e comportamentos alheios inadequados. Nenhuma criança ou jovem é isento destes contatos, mas eles podem ser mediados pela família. Há uma soberba necessidade de diálogo no lar.

Meu pai conversava bastante conosco. Ele tinha em casa armas de caça e por isso comprou um cofre forte do qual só ele e minha mãe sabiam a senha. No entanto, para saciar nossa curiosidade, montou um stand de tiro ao alvo no fundo da chácara onde morávamos e ensinou um por um como se atirava com uma espingarda ou como se atirava com revolver. Matada a curiosidade, trancou tudo e disse: “que jamais um atirador aponte a arma para outra pessoa”. Essas palavras eram dogmáticas, sagradas. Tínhamos um pai a obedecer e respeitar, sem medo.

 Meu pai foi um grande pai. Hoje, teria 103 anos. Meu marido é um grande pai.Espero que meu filho também o seja. Então, que Deus abençoe todos os pais que dispõem de tempo com seus filhos.


Meu pai e, abaixo, o pai dos meus filhos

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

SOBRE O ABORTO



Nossa Presidente sancionou lei que confirma a assistência da Saúde Pública aos abortos acontecidos dentro do que já era legal anteriormente: casos de gestação decorrente de estupro, saúde em risco da mulher... e por aí vai. Na verdade, a prática do aborto é onipresente na nossa sociedade. Só que há uma barreira entre os despossuídos e os mais bem aquinhoados de dinheiro, e é certamente na categoria dos mais pobres que costuma aparecer o assustador número de óbitos de jovens que abortaram seus fetos em condições clandestinas, muito abaixo das normas de assepsia exigidas pelo padrão médico.

 O martelo batido por Dilma Roussef na questão deve de princípio colocar um ponto final nos debatedores da causa anti-aborto, mas cabem ainda algumas considerações sobre o assunto, pelo menos por parte de alguém que não está engajado na causa pois o problema não se coloca mais.

Sinto muito que haja sobre a Presidente tamanha pressão de grupos religiosos; afinal o Estado é leigo e assim deverá permanecer enquanto república federativa. Mas as crianças brasileiras precisam de melhor assistência na área de educação sexual, pois elas são pré sexualizadas e, depois não tem respaldo técnico na hora de sua iniciação neste terreno.

 Nos dias de hoje, espera-se que as mulheres dediquem um tempo maior em sua formação para o mercado de trabalho, porém não existem cuidados de proteção a estas mesmas mulheres. E o instinto sempre fala mais alto. Uma visão antropológica nos mostra que, nas sociedades antigas uma moça podia ser dada em casamento logo após a primeira menstruação, uma vez que o papel feminino estava restrito às tarefas do lar. Hoje não é mais assim, no entanto a sociedade não se aparelhou para estas profundas modificações. Refiro-me aqui às técnicas contraconceptivas. Mas, para além destas gestações acidentais existe o caso do estupro, que é uma violência absurda. Ora, como passar tantos meses na vida tendo dentro da barriga uma criatura híbrida, entre o amor próprio e o ódio? Porque submeter uma moça a meses de tortura?


Tive três filhos na minha vida. O primeiro morreu com 3 dias. Os outros dois são gente adulta, forte, vigorosa, com princípios éticos inquestionáveis. Fui muito feliz em minhas gestações e penso que qualquer mulher normal possa sê-lo. Mas, ser vítima de um algoz e depois vítima do resultado da violência, é uma penalização duplicada e estúpida a alguém que nem sequer é réu.
Por esta e outras razões, gostaria muito que os arautos da fé calassem a boca em matéria que é alçada da psicologia clínica, e não das religiões. Em tempo, por razões pessoais eu jamais faria um aborto, ainda que reconheça a necessidade de oferecer tratamento humano a quem precisa fazer uso dele dentro do amparo da lei.