quarta-feira, 26 de maio de 2010

ATO FALHO

Não existe sobre o planeta uma só pessoa que em qualquer momento de sua vida não tenha cometido o seu “Ato Falho”. A expressão em si traduz um conceito psicológico, ou seja, revela conteúdos inapropriados que remetem a uma situação psicológica, seja de inadequação àquele tipo de pensamento, seja de cansaço na operação dos fatos cotidianos, enfim, uma bobagem que sai inadvertidamente sem a percepção imediata de que foi cometida. Aqui no Mogi News aconteceu algo parecido no jornal da última terça feira ( Caderno Brasil, pg. 1). A pessoa que inseriu e diagramou a matéria, por linearidade, escreveu “homenageadas” na nota superior e, “hemergentes”, na nota inferior. Depois, os textos correm tranqüilos, sem erros de ortografia. Claro, todo mundo percebeu que emergentes não tem e nunca teve o abominável “h” que lhe precedeu.
Como leitora contínua de jornais e revistas, me diverti muito com este equívoco, que pretendo chamar simplesmente de ato falho. Fiquei a me perguntar: quem teria diagramado e deixado passar a rata? Seria uma mocinha que adora aparelhar as coisas para dar um sentido estético de arrumação? Seria um funcionário cansado que bateu os olhos no parágrafo de cima e projetou inconscientemente o título de baixo? Seria um assassino de textos (não serial) disposto a matar sua sede de sangue na complicada língua portuguesa? Ou então um revoltado social (quem não é?) que procurou dar este H aos emergentes para que eles apareçam e sejam ridicularizados com mais perfeição?
O fato é que os emergentes são chatos mesmo, e lhes caberia bem esse “H” de heliasta, de hematopoiético, de helminto ou de helmódone. Seria heresia que fosse heril usar esse “H” que não coube na imprensa? Deveria ir para a forca o corretor e levar junto o diagramador? De modo nenhum. Quem botou essa letra a mais nos emergentes poderia até estar tornando a categoria mais nobre do que realmente é, mesmo sabendo que os emergentes tiram caca do nariz e escondem debaixo da cadeira, furam lugar na fila e dizem que já estavam lá antes, arrotam em público e dizem-se extravagantes. Então, não há crime a punir neste ato falho do jornalista.
Um dos maiores escritores vivos da língua portuguesa, o maravilhoso Saramago, importunou-se tanto com as normas da redação que um dia pregou-lhe os pés nos fundilhos e passou a escrever sem parágrafos, pontos, vírgulas, dispondo do texto como as máquinas de escrever e os dinossáuricos computadores bem entendiam. Marcou um estilo próprio, difícil ao leitor, mas rico nas idéias, o que lhe valeu um Premio Nobel de literatura. O interessante foi ele ter escrito um livro inteiro, “O cerco de Lisboa”, apenas para contar do ato falho de um “não” que mudou a história de Portugal.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Cat Duet - Boys Choir

TROCAS E PRESENTES



As caravelas portuguesas que navegaram no Atlântico, tinham algumas necessidades básicas. A primeira, naturalmente, era encontrar lugares com bastante água potável para continuar viagem. Outra, era plantar em pontos estratégicos, uma planta que dava fibras para o resistente cordame que sustentava as velas dos navios. Desta planta, as mudas foram trazidas do Oriente, e se adaptaram admiravelmente bem no Brasil. Em contrapartida os navegantes levaram daqui para Europa, uma espécie vegetal que lhes tornaria a vida mais saborosa. Foi assim que ganhamos de presente a maconha e demos em troca o tabaco aos europeus.
O efeito da canabis era já conhecido no Próximo Oriente. Dela retiravam uma resina à qual davam o nome de haxixe, e alegavam que o haxixe tornava os guerreiros mais valentes. Esses guerreiros infiéis receberam por isso o nome de haxixinos, donde temos o aportuguesado termo assassinos. Mas aqui no Brasil, o uso da erva não chegou tão longe. Quando muito, nos tempos coloniais, os escravos faziam um cigarrinho para pitar à noite na senzala e, quem sabe, sonhar com sua liberdade perdida.
Na metade do século XX, fumar maconha era coisa de batedor de carteira e, nem de longe alguém pensaria que, em um quarto de século ela estaria no topo das experiências juvenis. Conta a lenda que os Beatles fumaram-na dentro do castelo de Windsor quando foram condecorados pela rainha. E, no famoso festival de Woodstock, o que mais se via era gente curtindo seu barato na imensidão do campo norte-americano. Dali para frente, as aventuras começaram a se tornar mais perigosas. Outras drogas mais pesadas foram sendo consumidas e o problema da dependência se tornou uma questão de saúde pública.
Assim, estamos no lucro. Não se descobriu um único uso farmacológico para o tabaco, mas a erva da maconha, em contrapartida, vem sendo estudada e mesmo utilizada com finalidades terapêuticas. No entanto, no Brasil isso não acontece, pois as barreiras legais até permitem pesquisa, mas ainda não autorizam o uso de medicação com esse princípio ativo. O Dr. Carlini, por exemplo, é um dos estudiosos em pauta. Com ele estiveram José Rosemberg, José Elias Murad entre tantos, mas infelizmente aqui a lei corre em velocidade menor que a ciência. Assim, ficam sem esse possível tratamento, os portadores de esclerose múltipla, entre outros.
As drogas tem que ser pensadas, e não satanizadas. Avoco o milagre da experiência dos ancestrais. Os índios usavam curare para matar. Mais tarde, os pesquisadores descobriram o fantástico uso dos curarizantes para promover relaxamento muscular e facilitar, por ex., a intubação traqueal em pacientes necessitados. Foi um sucesso, que devemos à cultura tupiniquim.
Ivone Marques Dias

Retorno ao site

É bom voltar. De vez em quando a gente tira um tempo para ficar longe da telinha e então não se dá conta de que o tempo corre demais. Pois foi assim que desde janeiro só fiz ler escritores africanos, os quais me deixaram profundamente feliz com sua descoberta. Mia Couto, é irresistível; Pepetela me passa um sabor de fruta. Agualusa da-me arrepios. Le Clésio e Coeetze me embriagam. Muitos outros podem ir à lista, mas de agora em diante vou falar de cada um à sua hora. Não excluirei nem Karen Blixen nem Antonio Olinto, que, apesar de virem de longe, viveram a Mama`África tão intensamente.
Se acaso voce tiver o que dizer dessa literatura, mande-me para que eu inclua no Blog.
Ivone